Senado aprova saneamento como direito constitucional

Proposta alinha o Brasil com resolução de 2015 das Nações Unidas que reconhece o acesso ao esgotamento sanitário como direito fundamental

Published in 10 Apr 2025

Written by By the IAS team

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População com direito à Tarifa Social chega a 30% dos atendidos por serviços públicos de água
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O saneamento básico deve ser um direito social pela Constituição, decidiu o Senado nesta terça-feira (8). Uma votação em dois turnos aprovou a PEC 2/2016, modificando o artigo 6º da Carta que prevê os direitos sociais do cidadão. Com isso, o saneamento entra para uma lista que já inclui saúde, moradia e educação.

“Hoje, a gente torna, com essa PEC, o saneamento como um direito que materializa a nossa cidadania. É não ter, na porta de casa, o esgoto correndo. É não ter os nossos rios contaminados pela coleta e a entrega de esgoto não tratado nos nossos afluentes, onde a gente vai buscar água que o povo vai beber”, afirmou Rogério Carvalho (PT-SE), relator da proposta.

Segundo a proposta, “o saneamento básico inclui serviços essenciais que ajudam a garantir a saúde e a qualidade de vida das pessoas, como o abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto, manejo de lixo e drenagem de águas da chuva”. 

A PEC recém-aprovada complementa a PEC n° 06/2021, que propõe uma modificação na Constitutição para estabelecer como direito e garantia fundamentais o acesso à água potável “em quantidade adequada para possibilitar meios de vida, bem-estar e desenvolvimento socioeconômico”. Este projeto, que teve origem em uma proposta de 2018 do Senado, ainda se encontra em tramitação na Câmara dos Deputados. 

O texto da PEC recém-aprovada pelo Senado lembra que “a falta de saneamento básico é problema central para a falta de saúde” em periferias, áreas do interior e grandes cidades. “As consequências [da falta de saneamento] têm sido muito graves para a qualidade de vida da população, principalmente da parcela mais empobrecida”, diz o texto.

A PEC teve amplo apoio na casa, incluindo senadores da oposição. Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição, aproveitou para destacar a aprovação da revisão do Marco Legal do Saneamento durante o governo Bolsonaro. A proposta segue agora para a Câmara dos Deputados.

O reconhecimento do acesso à água limpa e segura e ao saneamento básico como direito humano fundamental tem uma longa trajetória. Um marco importante nesse percurso aconteceu em 2010, quando as Nações Unidas reconheceram o direito humano à água e ao saneamento básico na Resolução A/RES/64/292 (1085773), da qual o Brasil é signatário. 

Cinco anos depois, a mesma organização desmembrou os dois componentes e aprovou uma resolução estabelecendo o direito humano ao esgotamento sanitário como um “direito distinto, porém integrado” ao acesso à água.

Nos processos realizados na ONU, é fundamental destacar a atuação de dois personagens. Primeiramente, a jurista portuguesa Catarina de Albuquerque, primeira Relatora Especial da ONU para o DHAES (Direito Humano à Água e ao Esgotamento Sanitário), com mandato entre 2008 e 2014. Albuquerque foi responsável por reivindicar a inclusão do esgotamento sanitário numa proposta inicial que previa apenas o reconhecimento do direito à água. 

Em 2015, o engenheiro brasileiro Leo Heller, sucessor de Albuquerque na relatoria especial da ONU para os DHAES (2014-2020), encabeçou o desmembramento dos dois direitos. Segundo ele, em entrevista ao IAS em 2022, uma das principais motivações para essa separação foi de que existe uma defasagem muito maior no acesso ao esgotamento sanitário em relação ao acesso à água potável.

No mesmo ano, a ONU aprovou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), conjunto de metas na direção de um mundo mais justo, inclusivo e sustentável até 2030. O ODS 6 teve como foco a universalização do acesso à água potável e saneamento.

Apesar desse entendimento, a revisão do Marco Legal do Saneamento, aprovada em 2020, não incorporou nenhum dos dois direitos em seu texto. “A oportunidade perdida de incluir de forma completa entre seus princípios e objetivos da lei que o acesso à água limpa e segura e ao saneamento básico são direitos fundamentais, nos deixa para trás no avanço desses direitos”, comentou o IAS em texto publicado em 2022. 

Desde sua fundação, também em 2019, o IAS apoia a pauta dos direitos humanos à água e ao saneamento básico por meio de iniciativas como o Dia Mundial do Banheiro, debates com representantes do setor de saneamento, ações de articulação e incidência, conteúdos em texto e vídeo, e contribuições para publicações.

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