Dia Mundial da Água: colaboração em torno da água supera conflitos na história humana
'Água Pela Paz' é o tema escolhido pela UN Water para a campanha do Dia Mundial da Água em 2024
Publicado em 22 mar 2024
Escrito por Equipe IAS
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Disputas pela água acompanham a humanidade desde a Antiguidade. Historiadores registram um conflito relacionado à água e irrigação na Suméria do ano 2500 aC que durou um século.
Em tempos atuais, as permanentes tensões entre israelenses e palestinos nas últimas décadas contém inúmeras disputas relacionadas a fontes de água.
“Água Pela Paz” é o tema escolhido pela UN Water para a campanha do Dia Mundial da Água em 2024, em 22 de março. A UN Water é o mecanismo interagências das Nações Unidas que coordena os esforços nas questões de água e saneamento.
A UN Water destaca que conflitos em torno da água têm sido potencializados pelos impactos das mudanças climáticas e o aumento da população mundial. E que a resolução dessas disputas teria impactos amplos.
“A cooperação em relação à água abre caminho para a cooperação em todos os desafios comuns. Precisamos usar a água como ferramenta para criar um mundo mais pacífico e próspero para todos”, afirma a organização no site da campanha.
Segundo a UN Water, dos 153 países que dividem rios, lagos e aquíferos com nações vizinhas, apenas 24 reportam manter acordos de cooperação para o uso dessa água compartilhada.
De acordo com a iniciativa, a água frequentemente aparece em conflitos de três maneiras principais:
- Ela pode ser um motivador quando interesses diferentes (incluindo de países e regiões) batem de frente e são percebidos como irreconciliáveis ou quando a quantidade ou qualidade de água declina.
- A água pode funcionar como arma em um conflito armado – usado tanto pelo estado como por outros atores -, como meio de conseguir ou manter controle sobre territórios e populações ou de colocar pressão em grupos opositores.
- A água pode ser a vítima de um conflito quando recursos de água, sistemas de água ou funcionários de uma empresa se tornam alvos intencionais ou acidentais de violência.
Materiais informativos e de divulgação podem ser baixados no site oficial da instituição. Uma série de eventos está programada para o dia 22 de março em diversos países. O evento principal acontece na sede da Unesco em Paris, com palestrantes e especialistas, além de atividades culturais relacionadas ao conceito de “água e paz”. Na ocasião, foi lançado o “Relatório Mundial da ONU sobre o Desenvolvimento da Água 2024: Água para a Prosperidade e a Paz”.
Mapeando os conflitos
O site World Water, mantido pelo think tank sobre água Pacific Institute, traz um mapa interativo que lista 1634 conflitos sobre água, da guerra na Suméria mencionada no início do texto até ataques realizados por Israel em retaliação ao Hamas na Faixa de Gaza em 2023, que atingiram diversos poços d’água.
No âmbito da Conferência da Água da ONU de 2023, o Pacific Institute promoveu a palestra Water, War, and Peace (água, guerra e paz, em tradução livre) que abordou o tema quase um ano antes da campanha deste ano. Segundo a organização, o número de conflitos desse tipo ao redor do mundo cresceu entre 2000 e 2021, sendo a maior parte deles localizado na Ásia e África.
Conflitos desse período que ganharam projeção no noticiário internacional, como a Guerra na Síria e o avanço do ISIS no Iraque, passam por fatores como estresse hídrico, seca e a disputa por fontes de água. Guerras no Sudão e Ucrânia também têm sido palco de ataques à infraestruturas de água. Em 2000, a Bolívia foi palco de um levante popular contra a privatização, episódio emblemático que foi registrado no documentário “Bolivia, la Guerra del Agua” (disponível no YouTube).
Para além das guerras entre países, muitas disputas acontecem dentro de fronteiras nacionais. Segundo dados parciais divulgados pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), o Brasil registrou no primeiro semestre de 2023 um total de 80 conflitos relacionados a recursos hídricos.
A CPT observa que embora o total seja uma diminuição em relação aos 130 do período anterior, ele expõe uma realidade em que populações vulneráveis são vítimas de grandes empreendimentos. Entre os mais afetados, estão povos indígenas (32,5%), quilombolas (23,75%), pescadores (15%), posseiros (6,25%) e ribeirinhos (6,25%).
Segundo a Pastoral, mais de 60% dos conflitos pela água no Brasil envolveram mineradoras, 17% tiveram relação com hidrelétricas e 13% ocorreram em regiões dominadas por fazendeiros. Entre os conflitos ligados à mineração está o ocorrido em Barcarena, Pará, envolvendo a empresa Hydro Alunorte, que explora bauxita e alumínio, e a comunidade do Jardim Canaã, impactada ambientalmente pelas atividades da empresa. Em 2017, uma liderança da comunidade foi assassinada a tiros. Fernando Pereira também fazia parte da Cainquiama (Associação dos Caboclos, Indígenas e Quilombolas da Amazônia), que denunciava os crimes socioambientais da empresa.
Cooperação é a regra
Apesar do farto histórico de conflitos em torno da água, este não é um caminho inevitável. Ao contrário, a historia da humanidade aponta muito mais para a colaboração em torno da água do que para a disputa.
No site da campanha do Dia Mundial da Água, a UN Water lista três maneiras em que a água pode contribuir para o progresso:
- A água pode ser uma ferramenta para a paz. A história registra muito mais instâncias de cooperação do que conflitos relacionados a recursos hídricos.
- A água pode trazer estabilidade e promover o desenvolvimento sustentável. Isso pode ser conseguido por meio da cooperação entre os diferentes atores do setor, incluindo governos, empresas e instituições
- A cooperação em torno da água cria um efeito positivo que se espalha, contribuindo para que o mundo atinja os objetivos de desenvolvimento sustentável.